Na última semana, o Ministro da Economia, Paulo Guedes, entregou a primeira parte da proposta da reforma tributária ao Congresso Nacional.
Nesta primeira fase, foi apresentada a criação de um imposto único (CBS), que unificaria os impostos federais PIS/Cofins e teria uma alíquota única de 12%. As próximas partes da proposta devem incluir, ainda, temas como mudanças na tributação de dividendos, mudanças no imposto de renda e a criação de um novo imposto sobre transações financeiras, semelhantes à antiga CPMF.
Neste conteúdo, falaremos da tributação sobre dividendos:
- O que está em discussão até agora;
- E quais os principais impactos para as empresas e para os investidores.
A discussão acerca da tributação de dividendos já é antiga: em 1988 os dividendos passaram a ser tributados por meio do imposto sobre o lucro líquido (ILL, artigo 35 da Lei 7.713/88), com a cobrança da alíquota de 8% de imposto de renda na fonte para o sócio quotista ou acionista.
A partir de 1991, esse imposto passou a incidir somente sobre dividendos remetidos ao exterior (artigo 77 da Lei 8.383/91) e, em 1992 e 1993, houve isenção dos lucros já tributados na pessoa jurídica.
Em 1994, a distribuição de lucros e dividendos voltou a ser tributada, desta vez à alíquota de 15%, (Leis 8.849/94 e 9.064/95) e, por fim, foi definida a isenção ampla em 1995, sob o entendimento era de que a cobrança de dois tributos sobre o mesmo fato gerador (no caso, o lucro da empresa) gerava uma bitributação.
Recentemente, as discussões sobre o assunto voltaram, com abertura de uma série de projetos no Congresso Nacional que tratam do tema: PL 9.636/2018, PL 2.015/2019, PL 3.007/2008 e PL 1.619/2011.
O mais atual é o Projeto de Lei 766/2020, de autoria do Senador Randolfe Rodrigues (REDE/AP), em que é proposta a tributação de 15% para lucros ou dividendos pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas (tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado) em favor das pessoas naturais e jurídicas. Para beneficiários residentes em países com sistemas de impostos favorecidos (paraísos fiscais), a alíquota seria de 25%.
O Brasil é um dos poucos países que não tributam lucros e dividendos, segundo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Por outro lado, destaca-se que o IR de pessoas jurídicas no Brasil (34%) é maior do que o restante do mundo (média dos países da OCDE é de 24,18%).
A maior alíquota da renda advinda de dividendos é da Irlanda (51%), que incide imposto de renda sobre pessoa jurídica de 12,5%. Países como Grã-Bretanha tributam 38,1% para o beneficiário do dividendo, mas o IRPJ no país é de 19%. Estados Unidos, Alemanha e Espanha auferem tributação de, respectivamente, 30%, 26,4% e 23% sobre ganhos de dividendos, mas seu IRPJ é de, respectivamente, 21%, 28% e 25%.
O argumento do Senador é de que esta tributação de dividendos servirá para redistribuição em favor da população mais desprotegida em decorrência dos efeitos da pandemia Covid-19 na economia brasileira.
É importante destacar que, por ora, não se pode prever qual projeto será aprovado, ou até mesmo se eles serão acatados. Deve-se esperar, também, pela proposta que será apresentada pelo Ministro da Economia, a qual não fora divulgada – o que deve ocorrer dentro dos próximos meses.
Mas, afinal, caso a tributação sobre dividendos seja aprovada, a pergunta que fica é:
Quais os impactos para as empresas e investidores?
O impacto mais lógico seria a redução de resultados líquidos das empresas, principalmente de controladoras, as chamadas holdings. Estas empresas têm como principal objeto social a consolidação de resultados de subsidiárias, por meio da equivalência patrimonial, e teriam que pagar a alíquota no recebimento destes resultados, reduzindo-os.
Analogamente, reduziria o rendimento que os investidores obtêm com suas ações no que diz respeito à remuneração destas, o que pode motivar uma substituição do investimento de renda variável para um de renda fixa.
Em última instância, este capital investido em empresas locais pode até mesmo ser destinado a outros países.
Como alternativa para “fugir” desta incidência, as empresas podem migrar parcialmente a distribuição de resultados via dividendos para uma distribuição por meio de juros sobre capital próprio (JSCP). O JSCP é tratado como uma despesa financeira para as empresas e, portanto, dedutível de imposto de renda em seu resultado. Para o destinatário, possui a mesma alíquota de tributação: 15%.
Ou seja, o beneficiário paga, sobre o valor recebido, o imposto que a empresa pagaria, se absorvido como lucro. Este caminho, que visa compensar o aumento da tributação do beneficiário (acionista) em redução da tributação do doador (empresa), resulta na redução do lucro líquido final da empresa, uma vez que parte do montante do lucro foi lançado como despesa.
Outra possível forma de lidar com o cenário é aumentar a retenção dos resultados dentro da própria empresa, elevando a parcela de reinvestimento.
A principal discussão da ordem jurídica é se tal cobrança configuraria bitributação. A principal argumentação das empresas é de que a revogação desta isenção não prevê, pelo menos por enquanto, qualquer forma de compensação.
Conforme vimos, o assunto não é novo e tem sérios desdobramentos, tanto no mercado de capitais quanto na economia real. Ainda em fase primária, o debate segue para o Congresso, que deve ser o protagonista dos próximos capítulos.
Na próxima quinta-feira, seguindo a nossa série de conteúdos que tratam de legislações em debate e seus impactos nos investimentos, abordaremos o assunto de Tributação Periódica de Fundos Fechados.